sexta-feira, 5 de agosto de 2016

Hoje tropecei neste texto que escrevi há mais de 10 anos. Dá para VER, não dá? Não que foi escrito há 10 anos mas para visualizar. Pelo menos eu, ao lê-lo agora, consigo imaginar a cena.

Uma Questão de Espaço  

   Era uma manhã do início do Verão. O dia amanhecera claro duma luminosidade brilhante.

   Ema saíra de casa sem destino certo. Apetecia-lhe o ar matinal, a luz límpida, eventualmente o calor do sol. Sem outra preocupação que não a de estar, encaminhou-se para a praça. Sentar-se-ia na esplanada, beberia um café reconfortante e sentiria a manhã.

   Àquela hora, os habituais frequentadores salpicavam as mesas que se espraiavam pela esplanada com cálidas trocas de palavras antegozando um esplendoroso dia de sol.

    Sentou-se sob um largo guarda-sol verde de pano. Pediu um café e uma água e preparou-se para saborear a placidez da hora.

   Depois do café, continuou beberricando golinhos de água, observando os que cruzavam a praça, escutando rastos de sons que conduziam a frases sem nexo, descontextualizadas, sem querer fixar-se nesta ou naquela conversa.

   Uma suave brisa levantava-se agora e Ema sentiu-se grata por aquela aragem na manhã dum dia que se antevia quente.

   Lentamente, em gestos desusados, tirou da mala papel e caneta e ensaiava agora, não sei que rabiscos, mais letras ou mais riscos...

   Abstraída por instantes do que a rodeava, encheu páginas em gesto ritmado, seguro e vigoroso.

   A chuva caía copiosamente. A suave brisa arrastara nuvens carregadas que libertavam o seu conteúdo numa chuvada refrescante. Mas como surgira inesperada, espantava os que na praça procuravam o calor do sol. Seria por certo chuva de Verão: forte a cair, rápida a partir.


   Ema deixara-se ficar debaixo do largo guarda-sol que a escudava também da chuva. 

Porém, não na totalidade, pois um ou outro furinho permitiam que passassem pingas pesadas.

   A chuva intensificava-se. E, ou por isso, ou porque o olhar dos outros recaísse sobre a sua pessoa, resolveu-se a abandonar o refúgio daquele guarda-sol verde.

   Procurou então abrigo debaixo das arcadas e o sorriso dos outros, de que se destacava o do empregado de mesa, acompanhara a sua retirada.

   Ao passar, encarou-o, pediu-lhe outro café e sentou-se a outra mesa.

   Voltou a pegar no papel e na caneta e dispôs-se a registar impressões ou sentimentos numa letra miudinha, impercetível para o vizinho de mesa ou qualquer olhar indiscreto."  HES

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